Hachimangu

Um dos meus santuários xintoístas preferidos do Japão é, definitivamente, o Hachimangu. Ele é pequeno e, aparentemente, não tem nada de mais em relação aos santuários maiores. Ise, Izumo, Atsuta, Meiji, Kunozan, Tōshōgū, são santuários belíssimos e gigantes, porém, foi nesse pequeno recanto que senti alguma coisa inexplicável e ao mesmo uma estrondosa sensação de familiaridade. Foi lá que iniciei meus estudos de xintoísmo com seus sacerdotes e miko (巫女). Era lá que realizava visitas mensais para fazer minhas orações.

Localizado perto da linha do Trem Vermelho e no fim da Act Street, o Hachimangu se esconde entre casas e condomínios, sendo um ponto desconhecido para alguns moradores da cidade até os dias de hoje. Descobri o santuário em um guia bastante específico para os interessados em santuários e templos, apontando os principais “destinos do peregrino” em toda Shizuoka.

Pequeno, este espaço de adoração é dedicado ao Yahata-no-kami ou Hachiman (八幡神), um dos mais populares do Japão junto a Inari. Hachiman é uma divindade que reúne elementos do xintoísmo com budismo, considerado por vários séculos como o protetor dos guerreiros. Adotado como protetor do clã Minamoto (do Genji Monogatari), seu nome significa Deus das Oito Bandeiras, oito flâmulas que foram usadas para indicar o nascimento do Imperador Ōjin (509 – 571 d.C.).

Seus símbolos e respectivos shintai (神体) são o arco e o estribo, elementos de guerra dos arqueiros. Shintai são objetos materiais que conseguem canalizar as energias divinas, materializando a presença divina em algum local. Não, os deuses japoneses ou kami (神) não podem ser comparados ao nosso Deus ocidental, onipresente e onipotente, coexistindo com os humanos numa dimensão secreta ou oculta chamada Shinkai (神界).

Os santuários dedicados ao Hachiman são conhecidos como Hachimangu, sendo os mais famosos o Usa Jingu (Usa, Oita), Iwashimizu (Yawata, Kyoto), Tsurugaoka Hachimangu (Kamakura, Kanagawa). O pequeno Hachimangu de Hamamatsu abriga os elementos mais comuns dos santuários xintoístas, indicando um caminho e etiqueta específicos para a realização de orações.

De modo geral, os santuários xintoístas são demarcados pelo famoso portal japonês conhecido como torii, simbolizando a separação do nosso mundo com o mundo sagrado onde habita o kami (existem variações, em especial nos santuários dedicados a Tokugawa Ieyasu, os Tōshōgū, cuja arquitetura é remetida aos templos budistas). Trespassado o portal, o visitante deve percorrer o caminho do peregrino ou sandō (参道), este demarcado por lanternas de pedra ou tōrō (灯籠).

Tōrō (灯籠)
Tōrō (灯籠)

Logo no começo do sandō existe um ponto específico dedicado à limpeza das impurezas antes de adentrar ao espaço de oração. Este ponto, conhecido como chōzuya ou temizuya (手水舎), mantém uma bacia de água pura e pequenas conchas de metal ou bambu, com a qual o peregrino realiza o Omairi (お参り), o ritual de limpeza das mãos e boca.

A partir de então, ele cruza os guardiões do santuário, os cães Komainu (狛犬) e se dirige ao Haiden (拝殿), construção cujos visitantes fazem uma doação ao santuário e realizam suas orações. Já o anexo subjacente, separado por uma cerca Tamagaki (玉垣), contém o Honden (本殿), a construção que abriga o goshintai (御神体) ou corpo sagrado do kami (神). O trânsito dentro desse espaço é bastante regulado de acordo com o calendário e permitido apenas aos sacerdotes e miko (巫女).

Apesar de destinado ao Hachiman, o Hachimangu de Hamamatsu abriga, assim como uma infinitude de santuários xintoístas, complexos voltados à divindades auxiliares, os Sessha (摂社) e Massha (末社), santuários auxiliares. O Hachimangu de Hamamatsu abriga dois desses, um destinado à Inari Ōkami (稲荷大神), o deus da fertilidade e agricultura e geralmente associado à cor vermelha, e outro dedicado ao Tokugawa enquanto divindade, chamado de Tōshō Daigongen (東照大権現).

Pretendo discutir outros pontos e questões do xintoísmo japonês em artigos futuros. Enquanto isso, aproveite para ler o artigo introdutório Caminho dos Deuses, aqui na Japanologia e envie suas questões e comentários.

Victor Hugo Kebbe

Um comentário em “Hachimangu

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